[DIREITOS HUMANOS] - Portela debate direitos e reforça papel político das escolas de samba

Cristina Índio do Brasil
Agência Brasil de Comunicação
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Foto: Departamento de Cidadania da Portela
Rio de Janeiro/RJ - Desde sua origem, a Escola de Samba Portela está ligada diretamente à valorização da cultura negra. Depois de escolher o Enredo para o Carnaval de 2024, baseado no livro Um Defeito da Cor, de Ana Maria Gonçalves, a agremiação abriu suas portas, na zona norte do Rio de Janeiro/RJ, para reforçar seu papel cultural e político e compartilhar o Projeto Portela por Direitos, que traz debates sobre temas como racismo, reparação e intolerância religiosa e o samba.

“O movimento de conhecimento e de letramento não vem de hoje, vem de Paulo da Portela e de Candeia. Toda Escola de Samba tem essa responsabilidade social para com sua comunidade, é nosso dever e estamos exercendo esse dever”, afirmou a diretora do Departamento de Cidadania da escola, Hellen Mary, em entrevista à Agência Brasil.

O MPF (Ministério Público Federal), por meio da PRDC (Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão), e o Departamento de Cidadania do Grêmio Recreativo Escola de Samba Portela participaram, no Rio de Janeiro/RJ, da 2ª Edição do Projeto Portela por Direitos.

RODAS DE CONVERSA
A ideia é promover rodas de conversa sobre Direitos Humanos no Rio de Janeiro.

“Os temas estão sempre relacionados à efetivação de Direitos Humanos
e os participantes atuam na mobilização da comunidade e na criação de iniciativas que levem à concretização desses direitos”, informou o MPF.

“Sabendo do peso e da força que as Escolas têm para a circulação de saberes, para a construção da identidade e o diálogo com sua própria comunidade, a iniciativa tenta aproximar esses mundos e, no nosso caso, o mundo institucional jurídico, que tenta fortalecer a luta por direitos”, disse o procurador da República, Júlio Araújo, à Agência Brasil.

“O fato de trazer a discussão reforça a necessidade que isso seja feito com base no olhar da comunidade, a partir dessa troca. O projeto tem um pouco disso, de ajudar a fortalecer a reflexão e valorizar as escolas de samba como espaço de conhecimento. E também de viabilizar estratégias de atuação das instituições de estado, como o Ministério Público, para promover direitos”, completou Júlio Araújo

O projeto foi criado depois de a diretora Hellen perceber que, mesmo com tantas atividades promovidas na Quadra, faltava algo que tratasse do conhecimento dos direitos e deveres da população negra.

Depois disso, em entendimento com o procurador da República, Júlio Araújo, o projeto começou a ser elaborado. Em junho deste ano, ocorreu a 1ª Edição do Portela por Direitos.

“Chega, acabou o tempo de sermos humilhados, escorraçados e apanhando. Quando digo a palavra 'apanhando', é apanhar em todos os sentidos. Apanhar na Educação, na nossa moral”, ressaltou Hellen Mary.

“Nós temos que ter direitos e ocupar nossos espaços através do nosso conhecimento, do letramento racial, de sabermos quem nós somos e quais são nossos direitos e nossos deveres. É isso que o Ministério Público Federal está fazendo, porque é o dever deles”, afirmou.

Durante todo ano, o Departamento de Cidadania desenvolve várias atividades. A comunidade tem acesso a tratamento dentário, pré-vestibular social, aulas de dança afro e do ventre, capoeira, balé e as rodas de psicanálise e do jongo, além de sala de leitura na Biblioteca, inaugurada na FLIPortela (Festa Literária da Portela), que ocorreu em abril deste ano.

Para as rodas de psicanálise, a Portela fez parceria com a Sociedade de Psicanálise do Rio de Janeiro.

Os encontros destinados às mulheres e alunos de pré-vestibular têm ocorrido de 15 em 15 dias desde março e o próximo será neste sábado (21/10).

“A ferramenta tem que estar dentro da quadra, porque é a única maneira que nós, cidadãos, temos de nos armar e ter o poder público junto, de fato”, pontuou.

ESCRAVIDÃO
A necessidade de analisar a reparação pelo período de escravidão no Brasil levou ao tema da 2ª Edição do Projeto Portela por Direitos, que ocorreu no dia último dia 14.

O debate sobre Escravidão e reparação: herança de preto, coragem no medo discutiu o papel das instituições na escravidão e no tráfico de pessoas pretas.

Na roda de conversa, realizada na Quadra da Portela, houve depoimentos dos participantes sobre suas trajetórias na afirmação da negritude e de experiências no trabalho e na luta antirracista.

Os procuradores da República Júlio Araújo e Jaime Mitropoulos representaram o MPF e relataram a atuação da instituição na temática.

No entendimento do procurador Júlio Araújo, a compreensão do período e não esquecer o passado de atrocidades “é um passo fundamental para que esse crime contra a humanidade jamais se repita”.

Para Araújo, a recepção da comunidade ao encontro foi "excelente".

“O mérito é permitir que pessoas que não podem participar durante a semana, por causa do trabalho, estejam lá discutindo e ao mesmo tempo despertando os que estão um pouco afastadas do mundo do samba”, disse.

Hellen Mary também achou que o encontro foi um sucesso.

“Nós estamos sedentos do saber, nós queremos mais e mais e mais. E esse ano o enredo da Portela Um defeito de Cor, tudo está sendo propício”, contou.

AUDIÊNCIA PÚBLICA
Com a ideia de expandir as discussões, será realizada audiência pública em novembro, que vai contar com representantes do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania e OAB (Ordem dos Advogados do Brasil.

O procurador Júlio Araújo espera que a audiência resulte em propostas de políticas públicas com a temática.

“Acredito muito que pode ser um espaço de socialização do conhecimento e de fortalecimento de pautas e de políticas”, disse.

Segundo o procurador, ainda não há data definida para a audiência, mas o tema deve ser em torno de racismo, escravidão e reparação.

A 1ª Edição do Portela por Direitos foi realizada em junho deste ano e tratou do tema Racismo Religioso: Samba e Curimba na Jurisdição, abordando os impactos da intolerância religiosa.

As discussões se estenderam à importância da liberdade religiosa e às implicações criminais do discurso discriminatório de ódio a comunidades religiosas de matriz africana, além da importância da diversidade cultural.

Embora não tenha dia marcado, a 3ª Edição deve ocorrer em dezembro.

A escolha dos temas é feita pela diretora Hellen Mary e o procurador Júlio Araújo.

“Essas rodas são muito bem elaboradas. São uma troca mesmo. Nós conversamos. É uma construção. Eu escuto o que a comunidade quer e passo para o Júlio. Em cima disso, a gente vai elaborando qual é o próximo tema”, revelou a diretora, lembrando que as rodas são abertas ao público.

Com cordiais,
Saudações Fastianas
Teófilo Benarrós de Mesquita

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